19/10/2017

AZUL COMO O CÉU

-foto: Umnie - 

Nunca fizera tanto frio como naquele ano. E um bom frio sempre combina com um café bem quentinho, um livro novinho e uma cama confortável. Ou uma poltrona. Para a leitura fluir melhor e o café não derramar todinho. E ali estava o rei. Sentado em sua poltrona vermelha em um momento um tanto quanto íntimo. Apenas lia, mas gostava de uma conversa com a sua alma. Sozinho. Só de vez em quando.

A questão é que aquele bocado de pessoas ao seu redor, cobrando-o sobre assuntos governamentais, pessoais e sentimentais, às vezes, o deixava meio maluco. Mas eram crises de segundos. E os segundos não são eternos. Pois bem. O frio assolava toda a cidade, e às pessoas, não só o rei, buscavam, de qualquer forma, uma forma de cobrir-se, de sentirem-se confortáveis e quentinhos. Com qualquer coisa. Tudo era válido naquela ocasião. 

Mas a questão é que o danado do rei não estava confortável e totalmente bem. Falta Algo. Você sabe não é mesmo? Os seres humanos, meu Deus, nunca estão satisfeitos com nada. Nunca estão satisfeitos com o Nada. É fato que queremos e precisamos de Tudo. E aquele sentimento afligiu nosso rei. Calma. Era um homem bom, fazia coisas boas e queria o bem de todos. Mas às vezes, isso tudo não era necessariamente essencial e confortável. Ainda sim, aquele rei do um gosto literário incrivelmente bacana sentia falta de algo que confortasse o seu nada. 

A poltrona vermelha. 

Depois de um dia inteiro lendo naquela poltrona vermelha, percebeu. 1) Aquela não era necessariamente a poltrona ideal. 2) O que não te mata, te faz mais forte. Forte como se é em um braço de ferro contra alguém muito maior que sua pequenez. Ideal e forte. Duas oposições. A bolha. Mas era mesmo, ele precisava rever suas prioridades. A poltrona vermelha, mesmo que, difícil de ser dito, não era a certa para ele. 

Contudo, tinha que ser lembrada. A poltrona vermelha fora uma querida em tempos antigos. Era vermelha cor de sangue, marcante. Brilhava naquela loja esquecida. Era confortável até para os olhos. Mas ninguém a via. Coitadinha. O rei, quando em passeios, passava pela loja, e seus olhos brilhavam com aquela irradiação de sangue vermelho em seus olhinhos. Mas não dizia nada. Até que, por fim, um camponês a comprou. E aí, sabemos, foi só tristeza e humildade. Tudo junto. Precisava mesmo chorar pelo leite derramado e humilhar-se àquele camponês, de menor tamanho e menor classe social. Você sabe né, para recuperar o que nunca fora dele. E, enfim, conseguira. Mesmo que contra-vontades. Conseguira e a levara para casa com ajuda de um servos, embrulhada e guardada em sete chaves. 

E agora, ali, no presente, percebia: a poltrona vermelha não era a ideal. Suas costas doíam e seu dia terminava bem mal. Era hora, mesmo que com o coração sangrando, de dizer adeus e devolver ao camponês. Mas que loucura, a posse não é das melhores. E o rei da cidadezinha pensou e pensou e pensou. Talvez, mas só talvez, aquele momento fosse uma exceção. As costas doíam, mas o coração não. Não, é hora. Diga adeus. 

E foi-se. Tchauzinho grande poltrona vermelha. Os súditos logo trataram de levar ao camponês e o rei, naquele friozinho, ficara ali, deitado na cama. Mas algo tão lindo como a renúncia ao menor não deveria terminar ali por ali mesmo. E lembrou-se de um Presente. No porão. Com certeza, havia-se esquecido completamente. O Presente. Correu todo o gigantesco palácio à procura dele. Na verdade, dela. Uma poltrona ganhada, de graça, de um grande Amigo. E adivinhem? Azul. Azul como o céu. E adivinhem? Maior. E adivinhem? Mais confortável. E adivinhem? Não dava dor nas costas. E adivinhem? Pesava algodão. E o próprio rei a levara para seu quarto, feliz. E ali, em sua poltrona azul como o céu, lia e pensava. E o azul como o céu, o fazia lembrar de sua Casa.   

3 comentários:

  1. obrigado, continuo observando o quão fantástico cada letra nesse texto eh.
    ainda não sei o que comentar sobre o teto, mas sei que importa destaca-lo, porque são uteis mesmo. vou desligar o tablete e entrar no meu quarto Azul.

    ResponderExcluir
  2. vc pode escrever sobre as enormes responsabilidades e a personalidade do rei?

    ResponderExcluir
  3. Oi!! ♥

    Que lindo seu Blog! Já estou seguindo em todas as redes sociais :)
    Prazer, Maju

    Vem conhecer meu cantinho?
    https://cantodesol2.blogspot.com.br

    ResponderExcluir